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A mãe imperfeita

Porque a maternidade é difícil. E as mães precisam de rir.

A mãe imperfeita

Porque a maternidade é difícil. E as mães precisam de rir.

29
Mar18

Deixem-nos em paz

 

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Não digam a uma grávida com baixa por gravidez de risco que está de férias em casa. Não se atrevam a julgar todas as grávidas em casa pela bitola da burla ao sistema. Sabem quantas de nós estão a carregar nas costas verdadeiras gravidezes de merda, cheias de complicações reais? Sabem quantas de nós passam a maioria dos dias deitadas, cheias de medo que as placentas berrem de vez, que as contracções piorem e que os putos nasçam estupidamente prematuros (ou mesmo antes de poderem sequer ser considerados viáveis)? Sabem quantas de nós não davam tudo para poder ter uma vida normal e ir trabalhar todos os dias em vez de estarem presas dentro de casa saindo apenas para os dias de consulta? Fazem alguma ideia do esforço que é preciso para ir mantendo a sanidade mental no meio de tantas complicações, de uma prisão domiciliária e de todas as outras mil coisas que fazem parte do dia-a-dia de uma grávida "normal"? Não nos venham dizer que estamos de férias. A não ser que, com isso, queiram dizer que estamos de férias da vida porque isso sim é capaz de ser verdade. Estamos assim numa espécie de interregno, penduradas num limbo de quem não sabe o que pode acontecer, de quem se esforça ao máximo para minimizar as possíveis complicações que podem chegar, de quem deixou a vida em standby para poder trazer outra vida cá para fora. Sabem lá o que custa assumir uma gravidez que muitas vezes até teve a sua continuidade questionada pelos próprios médicos mas que a mãe (ou os pais), cheia de coragem e um amor maluco, deicidiu continuar. Não venham com essa merda das férias. E esqueçam isso das séries e dos livros. São coisas que acabam no primeiro mês. Mas lá fora a vida continua, as estações vão mudando, as épocas festivas passando. Não digam a uma grávida que está de férias. Se não tiverem nada melhor para dizer fiquem só calados, de boca fechada, mudinhos de todo. Sabem lá vocês.

 

E não, também não digam a uma recém-mãe que a licença de maternidade são umas férias de cinco meses. A licença de maternidade é só o período mais desafiador e confuso da vida de uma mulher. Come-se mal, dormir é uma miragem, há um ser novo que depende de nós para tudo e isso é muito mais que assustador. Até que se estabeleça uma rotina os dias são uma atrapalhação, não se consegue fazer nada. E mesmo quem tem ajudas em casa começa a ver a roupa a acumular, a hora da refeição a chegar e nada preparado, os móveis a cobrir-se de pó. Tomam-se banhos de cinco minutos, passam-se dias em pijama, o aspecto é digno de figuração no The Walking Dead. Não são umas férias. É um cansaço monstruoso, um esforço de adaptação, um desdobrar de energia e força. Não se atrevam a chutar contra nós a imagem idílica da mulher na poltrona, bebé na mama e música clássica e casa arrumada como panos de fundo. Essa imagem é uma mentira e são essas merdices que, às vezes, nos fazem acreditar que não somos tão boas como deveríamos, que o nosso melhor é insuficiente, que não chegamos a lado nenhum. Parem de debitar parvoíces de "agora tens tempo para isto, para aquilo e para o outro". Não temos. O tempo nunca chega, os dias passam a uma velocidade vertiginosa mesmo que alguns momentos pareçam arrastar-se por horas. Não são férias, nada poderia andar mais distante da ideia de férias. É um começar de uma vida e o começar uma vida de novo. É um bebé que nasce e uma mulher que, de repente, passa de filha a mãe ou, noutros casos, passa de mãe de um para mãe de dois ou três, é uma fase tão exigente que suga, esgota e cansa. No final de licença de maternidade todas as mulheres deviam ter férias. Deixem-nos em paz.

27
Mar18

Ter filhos é um mau negócio

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Ontem "conversava" com duas amigas no messenger e, de forma perfeitamente casual, as duas conversas foram bater na mesma tecla: o aumento disparatado das despesas assim que o resultado de positivo aparece no teste de gravidez. E na verdade nem estamos a falar de coisas supérfluas, não são as roupinhas maricas, os berços XPTO ou os sapatinhos assim e assado. São mesmo as coisas essenciais. Vejamos, durante a gravidez, quase todas somos seguidas por um obstetra no privado, calculemos então uma média de 7/8 consultas a 80€ cada uma. No meio disto tudo pelo menos a ecografia de rastreio do primeiro trimestre, a morfológica e a ecografia do bem-estar fetal do terceiro trimestre também saem do nosso bolso. Como sou generosa façamos uma média de 100€ por ecografia (hahahaha). Ora bem, só neste número vamos em 860€ e os putos ainda nem nasceram. Adicionemos à fase pré-natal a necessidade de comprar meia-dúzia de roupinhas e um saco de maternidade. Fazendo as contas (muito) por baixo só aqui ficam mais 100€. Entretanto também é necessário investir num ovinho, num carrinho, num berço, numa banheira e, mais que não seja, numa cómoda para colocar as coisas do miúdo. Vou deixar de fora a espreguiçadeira e a cadeira da papa e arredondar isto tudo a uns bons 1500€*. 

 

Continuando a saga, os putos depois nascem e começam a gastar fraldas como se não houvesse amanhã. Os pacotes de fraldas não são baratos, independentemente da marca, e não é como se as despesas ficassem por aqui. Quem não tem leite, seja porque motivo for, tem que comprar o adaptado que é disparatadamente caro. Depois há ainda o gel de banho, o creme de corpo, a pomada para mudar a fralda... É uma lista sem fim. Até que, assim de mansinho, chegam as vacinas extra plano. Outro pesadelo do caraças. Entre vacina contra o rotavírus e bexsero podemos contar com mais 500€. As calculadoras começam a funcionar. As mães voltam ao trabalho.

 

Começa a creche e, em algumas localidades, as mensalidades são valores absolutamente aberrantes. Criancinhas de berçário que levam as fraldas e o leite e ainda deixam de mensalidade 300€ (ainda bem que vivo na aldeia, juro). Enfim, é o que temos e é para isso que temos que trabalhar. Na creche começam a sujar cada vez mais roupa e as compras não param. Quando começam a andar são os primeiros sapatinhos adequados (entretanto com o gatinhar já rebentaram meia dúzia deles mas de uma gama mais pobrezinha). É altura de investir numa cadeira auto porque os putos já não cabem no ovo e os pais que escolheram ter pediatra já vão com uns bons euros em consultas. E diz quem sabe que a tendência é piorar.

 

Isto tudo para dizer que escolher ter outro filho é começar tudo outra vez (ainda que algumas coisas como o carrinho, o berço e assim, possam ser aproveitadas de um irmão para o outro). Para a classe média, da qual faço parte, a opção pelo segundo filho é muitas vezes um acto entre a loucura e a coragem, a prova incondicional que nestas coisas da paternidade a racionalidade conta muito pouco. Porque se fossemos dar ouvidos à matemática garanto-vos que o mundo estava dominado pelos filhos únicos. Ainda bem que, cá por casa, não somos muito dados a contas.

 

* Deixei de fora, deliberadamente, o valor pago para criopreservação das células estaminais. É opcional e, portanto, não entra para estas contas. Nós, cá por casa, não fizemos.

26
Mar18

A gravidez é um unicórnio, um arco-íris e um coração

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E pronto, cá estou eu, uma grávida zangada e enjoada, sempre disposta a puxar para o lado negro todas as mulheres incautas e que ainda nunca engravidaram. Estou a brincar. Quero dizer, na parte do zangada e do enjoada estava a falar a sério. Na parte do lado negro nem por isso até porque, eu própria, a pessoa que menos gosta de estar grávida à face do planeta terra, engravidei duas vezes em dois anos. Mas não é cá por ser uma espécie de grávida permanente que tenho que dizer que isto é tudo muito lindo e portanto, hoje vou escrever sobre os aspectos menos românticos da gravidez. Sabem aqueles aspectos que quase todas experimentamos mas sobre os quais ninguém fala? Aqueles aspectos que, por serem tão mundanos, até envergonham as pessoas e, por isso, são empurrados para debaixo do tapete? Vamos a eles.

 

Gases - Ora pois, haverá por aí muitas grávidas que não padeceram deste mal? Ainda há uns dias uma amiga minha dizia que sofreu tanto com gases que tinha dores até às clavículas. Pela parte que me toca esta gravidez tem sido lixada mesmo a roer aero-oms como se fossem rebuçados. São dores de barriga brutais, sinto esta coisa toda a mexer cá por dentro e, a parte mais sexy de todas, arroto tanto que posso na boa entrar numa disputa com um camionista cheio de cerveja que ganho à vontadinha. A sério, ninguém merece. Sinto que tenho tanto ar cá dentro que não sei como é que ainda não flutuo. E dói, é chato e muito pouco cor-de-rosa. Mas é real, comum e a culpada é a progesterona.

 

Incontinência - Estão a ver quando chegamos ao fim da gravidez com uma barriga gigante e a bexiga completamente comprimida pelo nosso amigo útero? Hão-de experimentar espirrar ou dar uma boa gargalhada assim do nada e depois contem-me lá qual a sensação de perder três ou quatro pinguinhas. É aquela altura em que uma pessoa tem que ir às gavetas à procura de um penso higiénico que por lá ande esquecido que até tem medo de sair à rua e haver desastre outra vez. Felizmente, na grande maioria dos casos, a incontinência acontece num período curto e é resolvida com o parto. Pior ficam as mulheres que depois do parto mantém a incontinência. Bolas, uma pessoa espera sempre que essas coisas só venham lá para os finais da velhice mas vai-se a ver e, afinal, só é precisa uma fecundação bem sucedida. Lovely.

 

Desejo sexual - Sabiam que a mulher é a única femea na natureza que se deixa cobrir quando está prenha? Se não sabiam ficam a saber. Agora vamos lá ver, deixam as que deixam porque há aquelas que simplesmente perdem o apetite sexual todo e nem querem cá ouvir falar em pinanço durante quarenta semanas. Primeiro porque estão enjoadas, depois porque lhes faz impressão, depois porque a barriga é grande e depois só porque sim. É isso ou uma gravidez de alto risco onde levam logo às seis semanas com o aviso do obstetra. E depois há o outro lado, as que ficam completamente tresloucadas com o cocktail hormonal e quase que violam os maridos que só não fogem porque não podem. Seja como for nunca nada é igual. As culpadas? Hormonas, hormonas, hormonas.

 

Acne, manchas na pele e linha nigra - Estão a ver aquela conversa dos cabelos ficarem fortes, a pele hidratada e brilhante e as mulheres lindas e maravilhosas? Hahahaha. Tudo mentira. Ou, pelo menos, tudo mentira pela parte que me toca. Ainda antes das dez semanas já estava carregadinha de borbulhas na testa e com o cabelo muito mais oleoso que o meu habitual. Ninguém morre por ficar feia e tudo passa mas epá, é aborrecido. Na outra gravidez andava sempre cheia de protector solar na cara porque o sol fazia logo o melasma aparecer. Desta vez tem estado sempre de chuva portanto não sei o que vai acontecer mas, por via das dúvidas, o protector solar de rosto 50+ já mora cá em casa. Ah, calma, falta a linha nigra, aquela linha castanha super sexy que nos divide a barriga ao meio ali a passar pelo umbigo e que só desaparece completamente não sei quantos meses depois do parto. Não queiram comprar fatos de banho e depois venham para cá chorar. E querem saber outra? Não queiram ter que levar as injecções para maturar os pulmões dos putos. Se levarem fujam da lua cheia porque é nessas noites que nos transformamos em lobisomem tal não é a quantidade de pelos que nos aparece no corpinho. Giro, giro, giro.

 

Vómitos - Se há mulheres que se escapam a esta saga outras há, como eu, que vivem com ela desde o primeiro ao último dia. E quem é que não gosta de acordar enjoada e perfumar tudo com o cheirinho a azedo enquanto o marido, meio em desespero, lhe segura na testa? Esta última parte comigo não é muito usual uma vez que de tanto vomitar já sou praticamente independente na cena. É uma parte do meu dia como qualquer outra. A única questão é que não posso lavar logo os dentes a seguir para não ficar ainda mais mal-disposta. Mas se esperar ali uns quinze, vinte minutinhos é absolutamente tranquilo. Depois é comer e esperar que a má-disposição apareça outra vez. Como a tudo na vida uma pessoa habitua-se e vai gerindo. 

 

E pronto, agora que já meti mais meia-dúzia de defensoras da beleza da gravidez a hiperventilar, vou à minha vidinha. Às mulheres que estão a pensar engravidar digo "força nisso", afinal a gravidez dura umas 42 semanas na pior das hipóteses e depois tudo passa. Pelo lado positivo são uns belos meses sem período e, se não tiverem o azar de vos bater uma diabetes gestacional à porta, podem comer pior do que o costume que ninguém fica a olhar para vocês com cara de quem está à espera que, a qualquer momento, se transformem na baleia azul. Isto é preciso é sorte.

23
Mar18

Deixem os miúdos em casa

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Gosto muito de crianças, sempre gostei. Reparem, eu própria ainda era uma criança quando nasceu o meu primeiro sobrinho e, à medida que os anos foram passando, os sobrinhos foram continuando a aparecer. Basicamente nunca me lembro de viver sem ter crianças por perto. Em 2016 fui mãe pela primeira vez e este ano repito a dose. Posto isto as crianças são e sempre foram uma parte integrante da minha vida. Gosto delas e elas, habitualmente, gostam de mim. E é exactamente por este motivo que acho que as devemos deixar ficar em casa numa grande variedade de situações. Os pais querem ir jantar fora a um restaurante um bocadinho mais "à frente"? Deixem os putos nos avós. Os pais querem ir ao cinema, a um concerto ou a um recital de poesia? Deixem os putos com os tios. As mães querem ir a uma reunião, a um workshop ou a uma apresentação? Deixem os putos em casa com os pais.

 

Antes que me comecem já a rogar pragas, eu explico. A maioria dessas situações não são divertidas para os miúdos, antes pelo contrário. Eles ficam fartos, aborrecidos, forçados a estar ali contidos. E toda a gente sabe que, muitas vezes, é exactamente nestas situações que eles ligam o "botão da asneira". Acreditem que eles ficam mil vezes mais satisfeitos a jantar em casa dos avós, com aquelas batatinhas fritas caseiras e aquela mousse de chocolate maravilhosa, do que enfiados num restaurante onde não podem dar um pio. Em casa dos avós, dos tios ou de quem seja, eles são assim uma espécie de pequenos reis que vêem as suas vontades prontamente atendidas e recebem mimo sem fim; nos restaurantes, recitais e workshops são só a figura que é preciso manter controlada e dominada para que não incomode os outros todos e acabe por desestabilizar o ambiente inteiro. É por isso que eu, mãe imperfeita, sou absolutamente a favor de poupar as crianças e de nos poupar a nós próprios de certas e determinadas situações cheias de potencial para se tornarem altamente stressantes para todos os envolvidos.

 

Agora digam-me lá "nem todos temos avós ou tios disponíveis e, na grande maioria das vezes, não temos com quem deixar os miúdos; queres que fiquemos encerrados em casa?". Pronto, tudo certo. Em primeiro lugar lembrar que há imensos locais e imensos programas para famílias e, por isso, com um bocadinho de boa vontade dá para não ganhar bolor em casa e não ganhar uma úlcera no estomâgo a tentar controlar os putos em "ambientes adversos". Em segundo lugar sim, eu percebo que, muitas vezes, não haja alternativa e as crianças acabem mesmo por ter que ir a tiracolo com os pais. Mas nesse caso, mães e pais deste país, tenham por favor em atenção que a liberdade dos vossos filhos acaba onde começa a liberdade dos outros (adoro, adoro um bom chavão). Não há nada que rebente mais os nervos das pessoas do que estarem em qualquer lado e levarem com um miúdo irritado, aos gritos, a colidir com cadeiras, a saltar por todo o lado e depois, quando se olha para os paizinhos, eles lá estão, a agir como se não fosse nada com eles, com o ar seráfico de quem tem toda a calma do mundo.

 

Epá, não. Não pode ser. As coisas estão a correr mal, os miúdos estão a incomodar as pessoas? Os senhores paizinhos têm que levantar o rabo da cadeira e meter os pontos nos i's. Se forem contra a bela da nalgada calmante (eu não sou mas respeito quem seja) então que vão com as crias à rua apanhar um arzinho e voltem a entrar só quando elas já estiverem capazes de não rebentar com os neurónios de metade das pessoas no espaço. Se ainda assim não resultar olhem, tenho pena mas... Caminho de casa que se faz tarde. Há poucas coisas piores do que estar num espaço onde se pagou e não poder desfrutar porque os filhos dos outros estão possuídos por satanás e os paizinhos cheios de calma ligaram o botão de ignorar. Reparem que não falo de espaços próprios para crianças, aí temos muita pena, quem lá está sabia bem ao que ia, azareco. Falo de espaços mais específicos, mais restritos, onde crianças em pico de mau comportamento podem realmente incomodar. Quem de nós nunca teve vontade de esbugalhar os olhos a um puto mal-comportado? Agora é lembrarmo-nos que esse puto pode ser o nosso filho e pensar que a responsabilidade é toda nossa. Olhem, que bem que se está em casa.

 

 

* Imagem retirada do Google

21
Mar18

As mães dos filhos que não comem

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Há, no grande grupo das mães, uma parcela delas a quem me parece digno entregar o título de super-mães. E não, não são as mães que se levantam às cinco da manhã para fazer sopinhas frescas todos os dias nem as que lutam bravamente contra o açúcar e se desdobram em alternativas culinárias. São as outras, aquelas que em desespero juntaram duas colheres de papa no biberão do leite do bebé de três meses, as que aos cinco meses experimentaram dar Nestum, e que aos seis meses já metiam sal na sopa. As que, na aflição de verem os filhos sem comer, deixaram de olhar para rótulos e começaram a ceder na tentativa desesperada de fazer com que os filhos, efectivamente, comessem alguma coisa.

 

Isto na teoria somos todos uns pais muito completos, essa é que é a verdade. Se fosse o nosso filho a não comer a gente deixava-o com fome e haviam de ver se, às tantas, ele não abria a boca à sopinha com toda a satisfação. Só que isto é a teoria ou, quanto muito, é aplicável na prática a miúdos que geralmente comem bem e que, por qualquer motivo, estão em dia não no que à comida diz respeito. Experimentem lá ter um que passa bem sem uma, duas, três, quatro refeições. Experimentem lá ter um que passa lindamente com 100ml de leite num dia inteiro e depois venham para cá com ensinamentos. Quando os putos não comem nada até o pino à parede vale fazer. Há música, televisão, tablet, teatro, mãe, pai. Há o que for preciso para que o puto abra a boca e cada colher é uma vitória.

 

Cá por casa a criança come habitualmente bem e, excepto por duas semanas no início de Fevereiro, nunca houve problemas de maior. Mas só essas duas semanas chegaram para me fazer perceber a força que é preciso para lidar com um filho que não come. No caso do Pedro essas duas semanas culminaram na erupção de um pré-molar e no diagnóstico de uma otite mas só vos digo, foram duas semanas do caraças. Sopa era para esquecer, o segundo prato, independentemente de ser um dos favoritos dele, ficava praticamente intocado e lá iam valendo os bocadinhos de fruta que por vezes aceitava. Se no primeiro e no segundo dia relevei um bocado, ao terceiro dia já estava em desespero. Tinha que fazer um esforço desgraçado para não chorar de cada vez que terminava mais uma refeição "a zeros". Já fazia contas de cabeça à perda de pesa e à curva de percentil. Agora imaginem quem passa por isto todos os dias...

 

Há mães que todos os dias enfrentam num stress mal disfarçado as horas das refeições, há mães que todos os dias puxam pela cabeça na tentativa de agradar e acabam quase sempre com as expectativas frustradas porque nem assim a coisa foi, há mães que vêem os números que a balança marca de coração apertado, há mães que só querem que os filhos comam e pouco lhes importa que seja uma açorda, uma feijoada, uma papa industrial ou um biberão de leite. Essas mães merecem todo o respeito do mundo mas, muitas vezes, ainda são criticadas por não seguirem os preceitos dietéticos da moda. Quem as critica não sabe, certamente, o que é o desespero de ter um filho que não come. Essas mães deviam levantar as mãozinhas ao céu e agradecer todos os dias a sorte que têm. As outras lá vão andando, todos os dias na luta, cada colher uma vitória. A força e persistência nem elas sabem onde a vão buscar.

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